O
primeiro encontro ( o inicio da saga)
( Conto para crianças e adolescentes que vivem na era da magia.
Foi escrito para os meus filhos mais novos e para os meus netos, em honra dos gatos que viveram as suas vidas com a minha família e também em honra do físico que imaginou uma experiência célebre com um gato que existia vivo e morto ao mesmo tempo)
Era
uma noite de lua cheia: uma lua brilhante, tão esplendorosa que as
estrelas se foram deitar mais cedo , envergonhadas por não poderem
competir com o
seu fulgor. O luar de Agosto reinava
sobre todo este mundo noturno, que me envolvia no seu mistério vivo.
Os grilos e as cigarras quebravam o silêncio da noite com o seu
canto ao desafio, escondidas nas ervas e pedras do jardim. As
centelhas de luz dos pirilampos macho polvilhavam o ar com a sua
dança do pisca-pisca, enquanto as fêmeas mantinham a sua luz sempre
acesa entre as ervas. Estava a desfrutar de todo este espetáculo que
se desenrolava mesmo a frente da janela do meu quarto, quando este encanto foi
interrompido por um gato enorme que se intrometeu:
Miau! Miiiaau! Miauuuuu! Cantava o bichano sentado sobre as pedras do
jardim, em competição com todos os outros animais, iluminado pelos
raios mágicos da lua-cheia.
“- Cala essa boca! Tu aí gato barulhento! Deixa-me ouvir os grilos
e as cigarras! - vociferei para o bicho que pareceu entender as
minhas palavras, calando-se e virando a cara para a minha janela .
Deu um grande
salto atravessou a parede sem deixar buraco e aterrou silenciosamente no soalho do
quarto mesmo aos meus pés. Fiquei siderado, incapaz de reagir a tão
estranho acontecimento.
“- Um
gato que atravessa as paredes?!!! Será que estou a sonhar? Ou estou
a ter alucinações? - pensei com a boca aberta e o queixo descaído,
paralisado de medo.
O animal parece que leu os meus pensamentos e falou-me dentro da
minha cabeça para aumento do meu espanto:
-Não! Não estás a sonhar. Mas com essa boca tão aberta ficas
mesmo com ar de aluado!
- Um gato falante que tem poderes de atravessar as paredes? - pensei
sem conseguir articular palavra , mudo de espanto e ainda paralisado
pelo medo.
As palavras do gato soaram novamente na minha cabeça:
“ - Sou um gato viajante no tempo! Venho do distante passado em que
os humanos conseguiam falar com os animais e vou para o futuro em que
os homens voltarão a ser capazes de sentir e dialogar com toda a
natureza. Queres dar uma volta comigo?”
“ - Quero! - respondi admirado comigo mesmo por estar a responder
ao convite de um gato.
- Mas não quero ir ao passado! Quero ver o futuro!
-No futuro não há nada! - retorquiu ele – Ainda estamos a
construí-lo. Assim, como não te interessa o passado, resta-nos o
presente para qualquer lugar do universo. Onde queres ir?
- Escolhe tu! - respondi-lhe eu já mais calmo e integrado neste
ambiente estranho, de verdadeiro
conto de fadas.
No instante seguinte fomos transportados para um minúsculo quarto de
criança onde estavam dois meninos magros vestidos com roupas muito
coçadas. Um
deles desfeito em lágrimas dizia:
- Faço
hoje anos e não tenho ninguém com quem festejar, nem sequer um pão
na mesa para comermos.
O irmão confortava-o dizendo:
- A mãe está quase a chegar . Com certeza traz uma prenda para ti e vai fazer
um bolinho para festejarmos o teu aniversário.
Não pareciam notar a nossa presença. Comovido com tanta expressão
de pobreza disse para o gato falante:
- Tu
que tens poderes mágicos, porque é que não dás uma mesa cheia a
este menino? Não vês que eles estão cheios de fome?
- Sou apenas um gato viajante no tempo. Não me é permitido resolver
os problemas dos homens. Têm de ser eles próprios a resolvê-los.
Se tu quiseres podes dar-lhe um dos teus aniversários! Eu trago a
tua mesa de aniversário com prendas e tudo o mais para esta casa.
Aceitas?
- Sim ! Claro
que aceito! - disse quase sem ter tempo de pensar.
Entretanto chegou a mãe dos meninos com um ar cansado e o mais velho
correu logo para ela e segredou-lhe:
- O mano está lá dentro a chorar. Tem fome e como hoje é o seu
dia de anos pensou…
A mãe interrompeu-o:
- Trago aqui uma refeição para nós, que fui buscar ao contentor
das sobras de um restaurante.
É pouco, mas foi o que consegui arranjar… hoje não consegui nem
uma hora de trabalho.
Abraçou o filho enquanto um rio de lágrimas silenciosas nascia nos
seus olhos e lhe corria em cataratas de pela face abaixo.
Mãe! Mãe! Mano! Olhem aqui! Depressa! - chamou o menino aos pulos
na cozinha.
A mãe e o filho correram para a cozinha, assustados com tanto
alvoroço e depararam-se com uma mesa cheia de comida, bebidas, bolo
de aniversário e prendas.
- Foi um gato mágico que falava que mo me deu tudo isto. Desejou-me
feliz aniversário e foi-se embora pulando através da parede.
- Mãe és um amor! Como
conseguiste mandar vir tudo isto? É a melhor prenda de anos que eu
já tive! - e abraçou-se à mãe pulando de alegria, sem notar o
espanto dela e o do irmão.
- Posso ir chamar os meus amigos? Posso?
A mulher caiu de joelhos no chão a chorar, com os olhos postos no
céu. E,
acreditando que se tinha dado um milagre, rezou:
- Obrigado meu Deus por teres ouvido as preces desta pobre mulher!
De súbito tão depressa como chegamos, o gato levou-nos de volta
para a minha sala. Disse-me adeus e com um grande salto atravessou a
parede , desaparecendo na luz do luar.
De manhã a minha mãe encontrou-me adormecido ainda vestido, sentado
na cadeira, cabeça caída sobre num livro acerca de insetos que
emitem luz e som, ainda aberto nas folhas sobre os os pirilampos,
sobre a mesa em frente à
janela do meu quarto, que tem vista para o jardim. Resmungou com
carinho:
- Até se esquece da hora do descanso com essa mania de saber tudo
sobre animais. Aposto que esteve acordado até altas horas a ver os
pirilampos e outros bichos noturnos.
Pegou em mim ao colo com carinho e deitou-me na
minha cama, ainda ensonado , bem aconchegado entre os lençóis.
Acordei tarde, a pensar que também sou um viajante no tempo, que
tinha de procurar o gato mágico e o menino que tinha ficado com um
um dos meus aniversários.
Teria sonhado aquela aventura? Não imaginava que muito em breve iria
ter a prova de que todas as minhas lembranças, eram de factos reais.