22 julho 2023

A Sentença de Salomão

A sentença de Salomão

Desde tempos imemoriais que a as comunidades humanas e a sociedade se deparam com o julgamento de interesses antagónicos e têm de pronunciar uma sentença decidindo assertivamente  sem ter dados suficientes. Isto é especialmente relevante quando em causa está a avaliação de sentimentos como o amor. 
É aqui que a argúcia, uma capacidade caraterística humana assume o seu papel principal habilitando-nos a decidir assertivamente na aplicação da justiça com dados contraditórios, escassos ou propositadamente ocultados pelas partes litigantes. .
Quem não se lembra de em miúdo ter sido descoberto que furtou um bolo quando a mãe depois de nenhum dos filhos se ter acusado da proeza ter dito candidamente :  “
-Não precisam de confessar. Quem mexeu no bolo fica como eu com as palmas das mãos azuis e mostras as palmas das sua mãos. O culpado é o primeiro a vira as palmas das mãos para cima e a  verificando que está tudo normal  exclama : 
-Está a ver ! Eu não comi o bolo!!
Quem não tocou no bolo sabia que não podia ter as palmas das mãos azuis e não tinha pressa em demonstrar a “sua inocência”.
Quase todas as civilizações têm estórias exemplares desse tipo de aplicação da justiça. A nossa cultura ocidental  de tradição judaico cristã também conta uma dessas estórias atribuída ao rei de Israel : Salomão - o Sábio - quando teve de pronunciar-se sobre o direito de maternidade de duas mulheres que disputavam uma criança sugerindo que a mesma fosse dividida ao meio e entregue a cada uma a sua metade, esperou a reação óbvia da mãe verdadeira que horrorizada disse depois da rival ter aceite a sentença: entregue o meu filho inteiro a essa mulher, porque eu quero acima de tudo que ele viva.! 
Com essa argúcia  descobriu e castigou a impostora e marcou a História como seu cunho de sensatez e sabedoria.
Nós nestes anos da desgraça de 2022e 2023 estamos perante situação idêntica quando temos de nos pronunciar no apoio ou repúdio aos políticos que dos dois lados da contenda afirmam veementemente gostar dos seus povos  e querer a a liberdade e o bem estar do povo Ucraniano  demonizando o adversário (políticos, combatentes e povos) como o INIMIGO que encarna as forças de todos os males do universo.
Vejamos os argumentos dos políticos, das chefias militares, e das elites dos dois lados da contenda:
Do lado Russo,presidente Putin e os seus políticos da ultra direita nacionalista e imperial, ultra  conservadora, o Grupo Mercenários Wagner, os Interesses do Complexo  Militar Industrial e Interesses da oligarquia parasita, do cartel dos combustíveis fósseis, nascida da corrupção disfarçada de democracia, no acordar do sonho soviético.
Do lado Ucraniano, o seu atual presidente Volodomir Zelensky (apesar de ser de ascendência judaica confirmada) mais os seus apaniguados políticos da extrema direita, nazis confessos, o batalhão escola de  mercenários,  escondidos sob a capa da Metalúrgica  AzovStall, os interesses da oligarquia económica dos metais de construção e dos cereais. nascida no parasitismo dos bens públicos e da corrupção subsequente ao colapso a URSS e ao fim do sonho soviético.
Terceiros a interferir diretamente quer no despoletar da contenda,  instigando as inimizades, quer em plena guerra, enviando equipamento militar, armas e munições, suportando a logística beligerante, treinando militares Ucranianos e enviando quadros combatentes para o campo de batalha, auxiliando mercenários, especialmente de direita e financiando todo as as operações de logística de guerra :
- Os USA , a NATO e a UE que planearam com muita antecedência apropriar-se dos recursos materiais dos povos da antiga União Soviética, colocando nos diversos países, governos favoráveis aos seus interesses políticos, económico e militares, através de “revoltas populares” golpistas que derrubaram ou desestabilizaram governos eleitos, tudo isto sob a capa de luta pela liberdade e pela democracia, que agora os papagaios pagos dos média ocidentais e não só, classificam de “democracia liberal”, alegando ser essa a única forma de representação legítima da vontade dos cidadãos e do bem comum dos povos.
 Estes países onde se situam os interesses do maior complexo militar industrial do mundo, querem impor uma Ordem Mundial Unipolar sob o domínio económico, político e militar dos USA. Contudo até ainda há pouco tempo, no principio do Sec.XXI, defendiam a a globalização da economia a todo o custo, argumentando que só haveria liberdade num país, se estivessem abertos os mercados de bens, serviços, capitais e não houvesse lá restrição à circulação de pessoas de qualquer nacionalidade. 
A China e os países dos BRIC que pretendem deslocar essa ordem unipolar para uma ordem multipolar onde os seus interesses económicos também estejam bem representados. Este grupo de países apesar de oficialmente clamarem por conversações e solução pacífica do conflito auxiliam uma das partes e às vezes as duas (caso da Turquia com equipamento militar, apoio político e transacionando bens e serviços com a Rússia . 
Todos os políticos e militares justificam o seu comportamento com o amor aos seus povos e à  liberdade.
Analisemos todos os casos. 
Em primeiro lugar a Ucrânia : 
Que amor ao seu povo pode ser justificar cerca de 20 milhões de deslocados e refugiados de guerra, 
mais os milhares de mortos civis e militares, mais milhares de crianças órfãs, mais a  destruição total de largos setores da economia , mais o arrasar das infraestruturas de habitação, energia comunicações e telecomunicações, mais a corrupção generalizada, mais a perseguição prisão e mesmo assassinato de todos aqueles que não estão de acordo com a guerra, ou com a narrativa vigente, acusando-os de traidores - o que constitui crime contra humanidade.
Que amor aos seus, pode justificar a exposição propositada de inocentes a um urso enraivecido provocando o bicho, só para provar que ele é um urso enraivecido ?
Não será maior prova de amor afastar os que de si dependem do perigo e depois pacientemente tomar medidas de contenção, afastamento, apaziguamento e neutralização da fera, sem confrontos físicos despropositados e com resultados prejudiciais ,que agora vemos que que perdurarão por gerações.?
Só o amor ao tacho, ao penacho e ou a outros “amores” e obediências a interesses ainda mais, ocultos, escuros e tenebrosos, pode justificar o comportamento da classe política e militar e oligarquia  ucraniana. 
Analisemos agora o comportamento dos órgãos dirigentes da Rússia. Presidente, Governo , Parlamento, chefias militares, detentores poder económico, oligarcas e população civil. As elites políticas subjugadas aos interesses do grande capital do lobby dos combustíveis fósseis e do complexo militar industrial, aproveitando-se de duas situações reais: a perseguição às populações russófonas da periferia fronteiriça da Ucrânia e a quebra por parte NATO do acordo de não instalação de mais capacidade militar ofensiva nos países fronteiriços com a Rússia, difundiu na população o mito supremacista de que eram predestinados para libertar novamente o mundo do nazismo, como já o tinham feito durante a segunda guerra mundial. E também que esse nazismo estava infiltrado nos altos comandos militares da NATO  e do governo e das forças militares ucranianas. E mais, que os soldados russos seriam recebidos como libertadores, pela população ucraniana desejosa de ser libertada das forças do mal, uma vez derrubado o governo e conquistada a capital Kiev e apareceriam cobertos de gloria aos olhos do mundo.
 Assim o presidente Putin ordenou uma invasão da Ucrânia que pretendia ser rápida e temporária, a que por eufemismo chamou de Operação Militar Especial. Adicionalmente ameaçou os países ocidentais com o uso de armamento nuclear, caso houvesse intervenção direta de forças armadas da NATO. 
Do ponto de vista estritamente militar os comandos Russos acreditavam ter supremacia por serem os primeiros a dispor de mísseis hiper-sónicos virtualmente, indefensáveis pelos sistemas de defesa anti-míssil atuais e queriam testar o seu desempenho em situação de guerra real. Por sua vez os países da NATO também precisavam de testar o desempenho das capacidades militares Russas sem se exporem diretamente. 
A falta de adesão da população Russa e Ucraniana a esta mitologia supremacista, combinada com uma péssima preparação militar das forças armadas Russas e da retaguarda da industria militar e, ainda ao uso de material de guerra antiquado, para não chamar de obsoleto , deu origem a elevadas perdas materiais e humanas, com fracos resultados e um fracasso total dos objetivos de uma guerra relâmpago, transformando-a num conflito prolongado sem fim à vista, que consome tantos recursos humanos, que levou Putin a socorrer-se de grupos mercenários que foram obrigados a recrutar presidiários ou seja, criminosos para combater, na falta de soldados. Adicionalmente teve de socorrer-se da indústria de Drones  Iraniana e de outros outros países dominados por forças retrógradas. Essas forças de tropa mercenária sem patriotismo, sem suporte ideológico , sem limites morais foi carne para canhão, que praticou e continua a praticar os mais horríveis crimes, passando o seu mau comportamento moral e ser a imagem perante o mundo das forças armadas russas, ajudando a criar uma animosidade e uma aversão anti-russa na população da maioria dos países ocidentais. A Rússia foi exposta a condenação pública e a sanções económicas e até desportivas, que  afetaram severamente a toda sociedade Russa e não apenas as sua elites que por acaso até nem são tão afetadas , que as leve a demarcar-se do presidente.
Pergunto que amor é esse que os governantes russos têm ao seu povo, que além da exposição a uma guerra imoral desprestigiante, expõem toda a humanidade ao perigo de uma catástrofe nuclear que põe em causa mesma continuidade da civilização na terra?
 Tal como no caso ucraniano só o amor ao tacho , o amor ao penacho, uma basófia desmesurada  e interesses ocultos, podem tornar compreensível o comportamento irracional das elites Russas.
   Analisemos agora o comportamento dos órgãos dirigentes da União Europeia. Comissão Europeia, Conselho Europeu e Parlamento Europeu.
À data do início da desgraça anteriormente caraterizada, a Europa Ocidental e do Norte, desde Portugal até à Alemanha, Suécia Noruega e Finlândia, excluindo propositadamente os países do antigo Leste Europeu oriundos do extinto Bloco Soviético, era a parte do mundo que saiu claramente vencedora da prova de fogo que foi a Pandemia de COVID-19. 
Os países citados, demonstraram uma capacidade única de entreajuda entre eles e de coesão social sem precedentes na história, mantendo-se um espaço de paz segurança, elevado grau de liberdades, prosperidade económica e desenvolvimento harmonioso. Mantivemos viva a tendência para a equidade crescente que tinha caraterizado as duas primeiras décadas do Sec. XX. Estávamos no bom caminho para cumprir o compromisso do combate as  alterações climáticas e tínhamos garantida a liderança do caminho do desenvolvimento ecologicamente sustentável, tínhamos vencido a inflação e iniciado uma recuperação da economia com manutenção e até alargamento dos direitos cidadãos mais desfavorecidos. Já  havia experiências piloto de estabelecimento da semana de 35  horas de trabalho, no pós-pandemia, sem par nos restantes países economicamente desenvolvidos. 
Cultivávamos uma globalização responsável, defendíamos e praticávamos a resolução de conflitos pela via negocial e éramos exemplo e fonte de esperança e paz para o resto do Mundo. 
Só que, sub-repticiamente, se tinha instalado nos órgãos não eleitos da União Europeia uma corja beligerante e aventureira que, de súbito, começou a secundar as pretensões dos comandos superiores da NATO em estender o domínio militar político e ideológico do neoliberalismo até às fronteiras da Rússia e instigar os seus agentes na Ucrânia a endurecem a politica anti russa, que eles denominavam de anti Moscovo ou anti Putin, garantindo secretamente apoio militar principalmente com armas e munições e  apoio económico e político em caso de guerra. Não manifestavam nenhum pudor em apoiar nazis confessos e campos de de treino das forças nazis e da extrema direita mundial. 
Sentindo-se respaldado a tão alto nível, o rafeiro provocou o URSO que que mordeu o isco, alardeou a sua ferocidade,  a sua força e fez o que eles diziam que ia fazer. 
E a Europa diplomática e pacifista, mostrou a sua cara beligerante, a começar pela Inglaterra, seguida da Polónia, ao fornecer a apoio com material de guerra comprado  a crédito pelo governo Ucraniano cortando relações comerciais e, pasme-se até desportivas com a Rússia ,situação inédita.  Como a Rússia se tinha tornado no principal fornecedor de energia dos países do centro e norte da Europa, esta atitude provocou mais prejuízos aos europeus de que aos russos.  E apareceu de cabeça bem levantada o monstro papão da inflação galopante ,com graves problemas nos suprimentos de energia, metais e materiais de construção cereais e adicionalmente problemas financeiros, para as empresas e para os cidadãos europeus. No espaço de poucos meses desde o inicio da guerra até ao presente, os cidadãos europeus ocidentais perderam poder de compra, perderam direitos laborais e perderam a autonomia decisória que encapotadamente passou para a esfera dos USA da CIA e da NATO.
 O bem-estar e segurança europeus foram postos em causa e e,de um lugar de paz, passamos a viver no terror de uma guerra nuclear. De uma relativa calma social, passamos a enfrentar um dia a dia de agitação laboral, com  greves despedimentos falências e quebra da coesão social. 
As personagens mais proeminentes deste comportamento malévolo foram: a presidente da  União Europeia, Sra Ursula  Van der Leiden e o secretário  geral da NATO, sr Jens Stolenberg.
Graças a eles e aos seus planos de guerra por intermediação, que só trazem benefício ao complexo militar industrial ocidental e reforço dos complexos militares industriais Russo e Chinês. Os cidadãos europeus, da UE e de fora da UE, são quem paga as despesas desta guerra sem sentido, feita (continuemos pasmados!) debaixo da bandeira da liberdade e do amor aos povos europeus.
Se esta contenda fosse a julgamento na corte do Rei Salomão, este não teria dúvidas em condenar à pena capital todos os dirigentes e membros das elites atrás citados. 
Eu também não, e, encabeçaria o rol de testemunhas dos povos contra os membros das elites acusando-os de coautores morais e materiais do um gigantesco rol de crimes contra a Humanidade.

20 julho 2023

O fim da linha 2 - Apocalipse anunciado

 O que está para além do horizonte?

"Para lá daqueles montes....

Há outros rios, outras fontes,

Outras guerras, outro Deus,

E outros homens como eu...."

(citação do poema cantado por José Cheta em 1970 ) 

Todo o mundo é composto de mudança (1), mesmo o que fica para além do horizonte.

É esta a nossa fé, que sustenta a esperança sem provas, de que para lá daquilo que conhecemos, existam coisas que estão ao alcance da nossa compreensão ou pelo menos dentro do que podemos sentir quer pelos meios próprios quer por sensores artificiais.

As visões apocaliptícas de abismos cheios de feras, quimeras, demónios, potestades, bojadores, adamastores e outros seres mitológicos cantados pelos poetas, até agora têm sido desmentidas pelas experiências reais e prosaicas, mesmo que perigosas, de intrépidos exploradores, os "homens do leme",(2) que vencendo os seus medos e os dos outros, passam para lá do horizonte, trazendo-nos novas de outros lugares, derrubando os muros no pensamento e dando novos mundos ao mundo.

São estes os heróis do progresso em honra de quem Camões escreveu em "Os Lusíadas" a  frase sempre atual:

"Cesse tudo o que a antiga musa canta porque outro valor mais alto se alevanta !"

As pessoas, a sociedade a que pertencem, a civilização em que estamos inseridos, a nossa espécie, toda a vida na terra, o planeta, todos os astros do firmamento e até mesmo o universo chegam a um ponto em que encontram o fim da linha, em que até a própria mudança não se muda  já como costumava.

Em física e química, esta fronteira costuma chamar-se de "fronteira de mudança de fase" em que deixam de se aplicar as leis de conservação e de mudança conhecidos e passamos a ter em conta as leis de de uma nova física ou química aplicáveis á nova situação.

A mudança atual é tão rápida que " não se muda já como soía". As alterações climáticas, a emergência de saúde pública com as várias pandemias em curso, a emergência económica e social causada pela impossibilidade de manter um consumo crescente exigido  no modo de produção capitalista vigente, sem que haja no nosso horizonte um modo de produção alternativo, aproxima-nos do  abismo  agiganta os nossos medos naturais.

Estamos já a um nível de consumo médio de 1,2 Terras por pessoa, enquanto que o consumo nos países desenvolvidos ultrapassa as 36 Terras. 

Podemos tomar como certo que chegamos ao fim da linha que a natureza nos proporciona e que estamos perante o abismo de  enfrentar a sétima extinção em massa na História do planeta, com os ponteiros do relógio a marcar que falta um minuto para o Dia do Juízo.

A juventude dos países desenvolvidos reclama contra a inércia e inépcia de políticos e demais autoridades governantes, que nada fazem para diminuir a ameaça que pesa sobre a humanidade, mas não abdica dos seus hábitos consumistas , nem dos seus confortos excessivos, nem dos comportamentos promíscuos ou descuidados em termos de saúde.

A continuarmos assim, no fim da linha, para lá do horizonte, temos à nossa espera mesmo, coisas bem piores do as que nos mostram os filmes apocalípticos da mais ousada fantasia. 

E, além do mais não podemos esquecer que a natureza cobra sempre o que lhe devemos

A história mostra-nos que em cada extinção em massa do passado, do meio dos escombros, a vida emergiu vigorosa liderada pelas espécies mais adaptáveis e não as maiores, mais numerosas ou mais fortes.

Devemos fazer tudo para como espécie nos encontrarmos entre os sobreviventes.

(1) Citação do poema de Luís Vaz de Camões: o soneto "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades"

(2) canção emblemática da banda Xutos e Pontapés https://www.musica-portuguesa.com/xutos-pontapes-homem-do-leme-letra/


continua....