24 outubro 2010

"Um mundo sem regras" - livro de Amin Maalouf

UM MUNDO SEM REGRAS
Comentário ao livro homónimo de AMIN MAALOUF
Este ensaio de Amin Maalouf, apresenta as preocupações de uma grande parte da intelectualidade não alinhada do mundo. Embora o ponto de vista apresentado seja o de um homem claramente de fora do mundo Ocidental, que conhece esse mesmo mundo muito bem, por viver nele há longos anos e por partilhar a sua cultura, é um ponto de vista que poderia ser apresentado por qualquer intelectual ocidental que não tivesse muros no pensamento e fosse minimamente conhecedor da cultura e história recente do Médio Oriente.
É uma visão frustrada do mundo e da história recente, de uma pessoa claramente desiludida por ver ruir as suas esperanças e as suas crenças num mundo melhor, nascido a partir dos valores e práticas da vanguarda civilizacional do nosso planeta que ele entende que deveria ser: a Europa e os USA.
Eu entendo que este ponto de vista acontece apenas porque a grande parte da intelectualidade actual lhe faltam ferramentas teóricas que lhe permitam enquadrar os acontecimentos do último quartel do Sec XX e deste início do Sec XXI numa regra evolutiva da civilização (ou civilizações ) Humanas.
Mesmo assim Amin Maalouf demonstra uma mestria notável ao identificar exemplificar e interrelacionar, a maioria das causas de alguns dos acontecimentos marcantes dos últimos 50 anos como por exemplo:
  • A questão da legitimidade:
      • na governabilidade das nações muçulmanas
      • na implosão da URSS
      • no insucesso das politicas reformistas no mundo muçulmano do Sec. XX e Sec. XXI
      • no emergir das tendências para o nascimento dos estados Islâmicos no Médio Oriente e em geral no retrocesso do laicismo no mundo islâmico
  • A relação entre as guerras e o domínio dos recursos petrolíferos no Médio Oriente
  • As responsabilidades da Europa e dos EUA na deterioração da segurança internacional e no descalabro climático, económico e financeiro actuais.
  • A evolução da prática religiosa Cristã Católica como consequência da organização hierárquica centralizada desta confissão religiosa
    Por outro lado cita o historiador Arnold Toynbee ao relacionar a evolução civilizacional com duas variáveis objectivas que são :
  • a velocidade da evolução dos conhecimentos das técnicas e da organização social e
  • a velocidade das comunicações
    Segundo Arnold Toynbee a evolução da humanidade e das suas civilizações pode dividir-se em 3 estádios:
    1 – O período da uniformidade original - em que as mudanças eram transmitidas lentamente entre os homens e se sucediam a um ritmo ainda mais lento do que a respectiva transmissão. Esse foi genericamente o tempo considerado pelos historiadores como pré-história: o tempo da comunicação oral.
    2 – O período da diferenciação civilizacional com base geográfica - que se iniciou cerca de 4500 anos antes de Cristo com o nascimento da escrita e perdurou até cerca de 1500 da era cristã, em que a evolução dos conhecimentos da tecnologia e da organização social se sucederam muito rapidamente e era transmitidas muito lentamente em termos territoriais fora dos limites geográficos naturais das civilizações, o que levou à diferenciação linguística, étnica, nacional e política.
    3 – O período do contacto civilizacional - em que as comunicações se sucedem a um ritmo muito mais acelerado do que as mudanças. Para Amin Maalouf assim como para Arnold Toynbee esse período decorre desde 1500 até à actualidade
Eu acrescento um novo estádio neste modelo:
4 – O período da globalização - que decorre desde o último quartel do Sec. XX até à actualidade a que correspondem mudanças aceleradas (tempo de formação de tecnologia menor do que uma década desde as descobertas ou formulações teóricas) com os conhecimentos comunicados instantaneamente a todas as áreas do globo independentemente da civilização que domine territorialmente uma área específica.

O reconhecimento do valor intrínseco da abordagem de Amin Maalouf , leva-me a pensar que se este escritor tivesse conhecimento de ferramentas adicionais como:
  • o modelo das “revoluções da igualdade” ( A. Subida. 2005 – publicado neste blogue em 17-Out-2010 sob o título de “ Cristianismo e Revolução Civilizacional” )
  • a teoria do valor (A. Subida – 1997 – Uma abordagem pós-Marxista e pós-liberal dos fundamentos da economia política)
    teria menos angústias e apresentaria uma atitude menos marcada pela frustração, pois entenderia com maior facilidade as razões profundas das mudanças civilizacionais que estão a acontecer na actualidade e veria um sentido claro nas mudanças que estão acontecer e conseguiria apresentar previsões para as próximas mudanças.
    Entendo claramente que o mundo não está sem regras sem será sem regras, apenas terá novas regras nos tempos que se aproximam.
    No meu ponto de vista estamos a viver um período revolucionário, com clara substituição de paradigmas civilizacionais: sociais, económicos, formas de estado e governo, teorias cientificas e tecnologias - a quarta revolução da igualdade - num planeta dividido territorialmente em áreas civilizacionais com diferentes estágios de evolução em relação aos marcos estabelecidos pela teoria das revoluções da igualdade:
     -https://penanet.blogspot.com/2010/10/o-cristianismo-e-as-revolucoes.html
No meu entender as tensões atuais extremadas, acontecem porque a capacidade intrínseca de evolução de algumas civilizações no campo das crenças e das práticas sociais (capacidade de assimilação da mudança) é muito mais lenta do que a velocidade de comunicação e implementação da tecnologia.

1 comentários:

Kikas disse...

Mais um texto muito interessante e rico de sabedoria e conhecimento!
Apesar de ter sido escrito há 8 anos e por este tempo muita ter sido a alteração evolução tecnológica é um pensamento intemporal, pois poderia ter sido escrito hoje sem perder o seu fundamento lógico e valor de verdade aos olhos da nossa realidade atual!